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Luís Renato S. Costa
Sou mais presente na ausência.
Textos
Cartas de amor
Sim! Já escrevi cartas de amor!
Na adolescência e no início da vida adulta, em papéis especiais, e até com canetas tinteiro.
Cartas que eram cuidadosamente escritas (com palavras que antes de chegarem ao papel passavam pelo coração) e dobradas para caberem nos envelopes brancos de bordas listradas em verde e amarelo.
Nas primeiras linhas, as letras bem desenhadas, regulares, respeitando a boa caligrafia.
Nas últimas linhas, nem tanto.
Escrevi cartas que demoravam a chegar a quem se destinava e no lapso de tempo que se seguia, muitas vezes sobrevinha o arrependimento, sobrevinha a dúvida sobre a oportunidade e o momento do envio, sobrevinha o medo de que as palavras, por mais claras que parecessem, não fossem suficientemente capazes de expressar o que eu realmente sentia.
Os dias se passavam e eu fazia as contas: cinco ou seis dias até serem entregues, dois ou três dias para uma tomada de decisão sobre responder ou não, e mais cinco ou seis dias para receber uma resposta, que às vezes não vinha ou que chegava quando eu mesmo já não tinha a certeza sobre o sentia ou sobre o que havia proposto.
O mundo mudou, as cartas de amor foram paulatinamente substituídas por e-mails, gravações, outdoors, mensagens, até desaparecerem definitivamente.
Neste mundo líquido, onde nada é permanente, as mensagens são mais voláteis que as cartas. Podem ser apagadas facilmente, seu teor é facilmente deletado pela mente, bastando para isso que novos interesses surjam, novas oportunidades se apresentem, novas expectativas sejam geradas.
E quando isto acontece, nada fica.
É um ¨game over¨, onde tudo é ¨resetado¨ e a vida recomeça com zero pontos e novos desafios, também transitórios.
As cartas de amor, por sua vez, duram enquanto forem guardadas. Para desaparecerem demandam maior trabalho; no mínimo devem ser rigorosa e cuidadosamente cortadas, para que não se identifique o autor nem a quem se destina.
E se hoje, alguém que ainda as possui, ao relê-las reacenderá, ainda que fugazmente, a chama emanada por aquele(a) que um dia a emitiu.
Este que viveu muito e não aprendeu tudo, às vezes senta-se à mesa de trabalho (antigamente mesa de cabeceira) frente a uma tela e um teclado e se posta a escrever (não mais em papel comum e nem com canetas tinteiro), mais uma carta de amor.
Pode ser uma carta de amor à família, uma carta de amor ao trabalho ou uma elegia à vida.
No entanto, a contragosto do que prega o novo mundo, continua sendo uma simples carta de amor.
Sim! Escrevi muitas cartas de amor!
E ainda as escrevo
Luis Renato da Silveira Costa
Enviado por Luis Renato da Silveira Costa em 18/04/2024