Lembranças
Não pensamos na morte até o momento em que ela nos acena levemente, ou se deixa vislumbrar, à espreita. Nestes momentos nos damos conta de que somos finitos e que o momento de nos encontrarmos com ela inevitavelmente chegará.
E algumas questões afloram: quem sou? o que fui? o que fiz? qual é o meu papel na peça em que sou o protagonista e represento (bem ou mal) a minha própria vida? o que de mim restará? o que ainda tenho a fazer? o que ainda posso fazer? devo esmagar meus sonhos ou projetá-los para o infinito? do que preciso me arrepender? a quem devo perdoar? saberei aceitar com dignidade a minha hora ou partirei com raiva por ficar ausente deste insensato, surpreendente e maravilhoso mundo?
Pensar em morrer implica, necessariamente, em pensar no viver.
E o que é viver, afinal?
Éramos nada (não éramos), nascemos e vivemos.
Depois, morremos e voltamos ao que éramos antes de ser, ou seja, voltamos a não ser.
O que separa o agora do depois?
Alguém disse: “a vida pode ser comparada a uma joia muito valiosa presa a um fino fio por instáveis e frágeis pregadores, qual varal sob vento constante tentando sustentar peças de roupa. Basta uma brisa mais forte para que as peças caiam e se percam no vazio”.
Mas há uma enorme diferença entre o antes (de sermos) e o depois.
A diferença se consolida no depois, posto que nada é mais vivo que a vida que se viveu.
Nela se constroem as vivências; nela aprendemos e ensinamos; nela criamos laços e compartilhamos nossas alegrias e tristezas com aqueles que conosco desfrutam de um mesmo tempo; nela ansiamos por nossos sonhos e nossas expectativas, sempre em busca de um mundo melhor, se não para nós mesmos, para os que nos seguirão nesta longa e sinuosa estrada.
Por esta razão o depois essencialmente difere do antes, pois se éramos uma promessa que emergia do nada, hoje somos a realidade que muda o presente e que projeta o futuro.
Somos o elo inquebrável e insubstituível entre os que nos trouxeram a vida e nossos filhos, que continuarão a deslindar o novelo que esconde este milagre do qual fazemos parte.
Somos o elo mágico que liga o Criador à criatura.
Dos que partiram, o que resta?
Resta a lembrança, a saudosa lembrança.
E sempre que deles nos lembrarmos, com o coração aberto, eles reviverão em nós.
Felizes para sempre serão todos aqueles que um dia forem lembrados.
De nós, o que restará?
Restará, na memória dos que ficarem, nossos valores, nossos princípios, nossos atos e o que fomos capazes de amar.
Somente ficarão as lembranças.
Mesmo que não tenhamos feito muito, algo sempre ficará.
Que Deus nos permita, no infinito, um dia, sermos lembrados.
Seria a maior de todas as graças.
Luis Renato da Silveira Costa
Enviado por Luis Renato da Silveira Costa em 18/04/2024